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ISO 14644-16: A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA CHEGA ÀS SALAS LIMPAS

Postado February 2023

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ISO 14644-16: A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA CHEGA ÀS SALAS LIMPAS

Em 2013, a ASHRAE estimou que a superfície de Salas Limpas construídas em todo o mundo ultrapassou os 12 milhões de m2, com uma taxa de crescimento anual de 5%, pelo que é provável que por esta altura este número já tenha ultrapassado há muito os 15 milhões de m2.

As Salas Limpas têm aplicação e utilização numa gama cada vez mais vasta de atividades industriais e de investigação; já não estão ligadas apenas a setores de alta tecnologia e de alto valor acrescentado. No entanto, os critérios para a conceção, cálculo, construção e funcionamento de Salas Limpas permaneceram praticamente inalterados desde os dias em que estas salas eram concebidas para indústrias de alto valor acrescentado em tempos de baixos custos de energia.

Hoje em dia, a situação mudou, os utilizadores de Salas Limpas pertencem a setores muito diferentes, e muitos deles com condições de mercado mais modestas e expetativas de retorno do investimento e, além disso, numa situação comum de aumento crescente dos custos de energia.

Existem ainda setores de utilizadores de Salas Limpas que, devido à sua tecnologia e excecionalidade, mantêm um elevado valor acrescentado dos seus produtos, com retornos de investimento muito elevados; mas mesmo nestes casos, estão sujeitos à pressão social, institucional e mediática para reduzir o seu consumo de energia.

Nesta linha, a parte 16 da famosa ISO 14644 “Salas Limpas e Locais Anexos Controlados”, dedicada à Eficiência Energética em Salas Limpas, foi editada.

Esta norma define o processo para reduzir e otimizar os custos de energia, atuando globalmente no processo do ciclo de vida da Sala Limpa, desde o desenho conceptual até ao desmantelamento e colocação fora de serviço. Aplica-se não só a salas recentemente construídas ou remodeladas, mas também a Salas Limpas existentes e ativas.

ABORDAGEM SISTEMÁTICA

A ISO 14644-16 propõe uma abordagem sistemática para a avaliação da poupança de energia com base em sete etapas:

  1. Revisão dos Requisitos do Utilizador (URS) e exame da conceção desde o ponto de vista da eficiência energética
  2. Análise comparativa dos rendimentos da Sala Limpa
  3. Identificação das oportunidades de redução de energia
  4. Avaliação do impacto das oportunidades de redução de energia
  5. Seleção das oportunidades de redução de energia
  6. Implementação
  7. Monitorização e retorno da experiência

URS

Os Requisitos de Utilizador (USR) são a “primeira pedra” na construção de uma Sala Branca e o consumo de energia da futura instalação depende em grande medida da sua definição correta.
A ISO 14644-16 atribui uma importância primordial à redação correta e equilibrada da URS:

Por vezes acredita-se que quanto mais rigorosas e restritivas são as condições exigidas à Sala Branca, maior será a sua qualidade; na realidade, o excesso de especificação apenas dá a “aparência” de qualidade e acrescenta complexidade técnica, custo de instalação e custo de exploração.
Por exemplo, condições como a temperatura e humidade definidas com limites mais rigorosos do que o necessário podem ter um impacto económico significativo sem fornecer um valor de qualidade. Em muitas Salas Limpas, os produtos ou materiais processados têm limites termo-higrométricos que são mais amplos do que os limites de conforto dos operadores. Neste sentido, a norma ISO 14644-16 lembra que os limites de conforto geralmente aceites para a humidade relativa estão na ordem dos 30-70%; no entanto, é muito comum encontrar especificações de humidade relativa interior de 40-60% ou 45-55% em instalações que são destacadamente de conforto.
Outro fator importante onde o excesso de especificação é contraproducente é na “pegada” da Sala Limpa; quanto maior for uma Sala ou Área Limpa, maior será o custo de energia. Por conseguinte, a URS deve ajudar a definir uma disposição racional, onde os espaços são ajustados às suas necessidades reais e coordenados de acordo com o fluxo do processo, a fim de perder o menor espaço possível nos corredores e áreas de ligação
Há conceitos onde paradoxalmente o excesso de especificação pode ajudar à racionalização energética. O pessoal é a principal fonte de contaminação de uma Sala Limpa e, portanto, a maior parte do esforço de conceção vai para a eliminação da contaminação contribuída pelas pessoas; por isso, uma especificação mais rigorosa do vestuário dentro da Sala Limpa reduzirá a contaminação emitida e, portanto, o trabalho da instalação para manter as condições de classificação.

VOLUME DE AR

O movimento do ar juntamente com a compensação da temperatura e humidade é uma das principais fontes de consumo de energia em Salas Limpas, pelo que a redução do fluxo de ar impulsionado tem um impacto direto no consumo de energia. Em geral, o volume de ar é proporcional ao cubo da potência do ventilador, pelo que uma redução do volume de ar para metade reduz o consumo do ventilador por um fator de oito.

Possivelmente um dos conceitos mais difundidos ligados às salas limpas é o conceito de recirculações/hora ou alterações/hora (ACH Air Changes per Hour). É um conceito quase sagrado e praticamente intocável. Muitas Salas Limpas são postas em questão e mesmo rejeitadas por não cumprirem escrupulosamente as ACH especificadas, independentemente do facto de a contagem de partículas em repouso e a atividade estarem claramente dentro dos limites.

A norma ISO 14644-16 desmistifica e questiona a utilidade real das ACH como método de cálculo para a definição dos caudais de ventilação. A função da ventilação numa Sala Limpa é remover as partículas geradas pela atividade no interior da própria sala; por conseguinte, a norma propõe calcular o caudal de ventilação a partir das partículas emitidas no interior da sala por unidade de tempo utilizando a fórmula:

C: Concentração necessária de partículas de um determinado tamanho (contagens/m3);

D: Taxa total de emissão de partículas do pessoal e das equipas, em (contagem/s);

Q: Caudal do ar de impulsão (m3/s);

Ɛ: Eficácia da ventilação (adimensional).

A parte mais difícil é a estimativa dos parâmetros D e Ɛ

A taxa de emissão do equipamento pode ser assumida como realmente baixa, uma vez que uma das condicionantes para o equipamento e materiais que entram numa Sala Limpa é que não gerem partículas. A taxa mais elevada de partículas vem de pessoas e depende principalmente do vestuário e do nível de atividade.

Também é difícil fazer uma estimativa do parâmetro Ɛ, pois depende das características e posição das entradas e saídas de ar, da geometria da sala, da posição do equipamento, etc… Possivelmente a utilização de sistemas CFD pode ajudar nesta estimativa.

O parâmetro C seria o nível de partículas correspondente à classe ISO que se pretende conseguir, embora a norma recomende tomar um nível inferior de partículas como “alerta ou nível de segurança”. Assim, para uma ISO 7 que permite até 352 000 partículas/m3 de 0,5µ,deve ser escolhido um parâmetro C muito inferior (por exemplo, 1/3 que seria 117 330, ou 1/4 que seria 88 000)

Em todo o caso, os valores D e Ɛ sempre serão teóricos e sujeitos a controvérsia. A ISO 14644-16 propõe complementar o cálculo teórico com um sistema alternativo experimental, baseado na medição real de partículas na sala em condições operacionais. O sistema é desenvolvido em três etapas:

  1. Conceção: Um caudal Q1 é determinado por uma estimativa inicial da emissão de partículas e da eficácia da ventilação. Para esta primeira conceção podem ser utilizados dados muito conservadores, uma vez que se considera que o caudal obtido, Q1, será otimizado nas seguintes etapas.
  2. Teste: O caudal Q1 é testado na sala em condições operacionais e as concentrações reais são medidas para diferentes tamanhos de partículas. Com os dados obtidos, calcula-se um novo caudal Q2, geralmente inferior a Q1, que atingiria os resultados esperados.
  3. Operação: O caudal Q2 é utilizado na operação e os dados de monitorização são utilizados para confirmar que é o caudal adequado ou para otimizar um novo caudal Q3 mais eficiente.

Em qualquer caso, o caudal final, além de alcançar o índice de limpeza necessário, não deve comprometer outros parâmetros da sala limpa, tais como temperatura, humidade e pressão.

Esta nova abordagem torna o conceito de recirculações/hora ou ACH sem valor real. A própria norma dá um exemplo muito claro: Duas Salas Limpas com as mesmas fontes de emissões de partículas necessitam do mesmo caudal de ar, mas se uma tiver mais altura (e portanto mais volume) a ACH será diferente, embora o resultado das partículas seja semelhante em ambas as salas.

REGIME REDUZIDO, ELIMINADO E RECUPERAÇÃO

Durante os períodos de inatividade, quando o pessoal, que é o que mais contribui para a geração de partículas, não está na sala, o regime de ventilação poderia ser reduzido sem comprometer a classificação da sala. A redução deve ser coordenada com um ajuste automático dos compostos de ar de retorno, a fim de manter o regime de pressão relativa na sala, que também poderia ser inferior ao necessário durante o período de atividade.

Durante o período de inatividade sob funcionamento reduzido, é importante fechar os pontos de acesso à sala para evitar a entrada de contaminação.

Durante longos períodos de inatividade, pode ser mais rentável desligar o sistema de ventilação, e para isso deve ser analisado o impacto da paragem, avaliando a contaminação causada pela despressurização, a migração de partículas para o interior, as necessidades de limpeza antes de reiniciar a instalação e o tempo de recuperação necessário para regressar ao estado operacional.

CONTROLO ADAPTATIVO

Uma vez que a ISO 14644-16 desmistifica as recirculações/hora ou ACH, a consequência é a desmistificação de outro conceito, também intocável até agora e ligado à ACH: o caudal constante na impulsão. Até agora, as instalações básicas de ventilação numa Sala Limpa eram de caudal constante com impulsão e caudal variável (para controlo da pressão) em troca. Mas se for aceite que o caudal de impulsão depende da emissão de partículas, a variação na taxa de emissão de partículas implicaria a possibilidade de variação do caudal de impulsão.

Isto introduz o conceito de “controlo adaptativo”. Há setores em que é necessária uma monitorização contínua de partículas na Sala Limpa; por exemplo, o Anexo 1 GMP para os graus A e B ou a norma aeroespacial europeia ECSS para todas as classes até ISO 8.

Se houver um sistema de monitorização contínua, é possível definir um procedimento de controlo que ajuste o caudal de impulsão proporcionalmente às partículas detetadas em tempo real. Não é um procedimento simples, envolvendo filtragem e cálculo da média das contagens para se ter um sinal de controlo estável e considerando outros fatores que devem ser mantidos, tais como a pressurização e o controlo adequado da temperatura e humidade. No entanto, se bem desenvolvido, pode ser um dos sistemas de gestão de energia mais eficientes para Salas Limpas.

REDUÇÃO DE VELOCIDADE

Em sistemas de fluxo unidirecional (UDAF), o fator determinante não é o caudal de ar, mas sim a velocidade. O valor de 0,45m/s ±20% (0,36-0,54m/s) permaneceu inalterado desde que foi definido na década de 1960 pela US Air Force e consagrado na respeitável norma US FED-STD 209.

A ISO 14644-16 sugere a aplicação do mesmo raciocínio utilizado para reduzir o caudal em instalações de fluxo turbulento e para reduzir a velocidade das unidades UDAF nos períodos sem atividade no seu interior. A norma indica que em condições de pouca ou nenhuma atividade, a velocidade poderia ser reduzida para cerca de 0,2-0,3m/s.

A norma também sugere a avaliação da possibilidade de parar as unidades UDAF instaladas no interior de Salas Limpas durante os períodos de inatividade. Em geral, o caudal de ar de uma UDAF é geralmente muito superior ao caudal de ar da Sala Limpa em que está instalada, pelo que a poupança de energia conseguida terá um impacto considerável.

VENTILADORES

Para que uma redução de caudal seja transformada em poupança de energia, é necessário ter ventiladores que possam traduzir reduções de fluxo em reduções de energia sem perdas mecânicas ou de eficiência. Ao selecionar os ventiladores para uma Sala Limpa, deve ter-se em conta o seguinte:

  1. Alta eficiência: para transformar a redução de caudal em poupança de energia
  2. Variação de velocidade: para permitir um controlo adequado do caudal necessário.
  3. Transmissão direta: Para evitar as perdas de transmissão entre o motor e a turbina. (As transmissões clássicas de correias e polias, quando estão em boas condições, consomem entre 10 e 15% da energia total do motor, com correias fracas ou gastas devido à sua utilização, as perdas são muito mais elevadas.)

FILTROS

Os filtros de ar são uma parte essencial das Salas Limpas, mas são também um fator importante no consumo de energia. As altas eficiências de filtração implicam elevadas perdas de carga e a perda de carga está diretamente ligada à energia necessária para a ultrapassar. Em geral, a perda de carga é proporcional ao quadrado da velocidade e a velocidade é proporcional ao cubo de potência, pelo que uma redução de 50% na perda de carga reduz a potência do ventilador por um fator de 2,8.

O sobredimensionamento dos filtros é uma das principais causas do aumento do consumo de energia nas Salas Limpas. A adição de fases de filtração redundantes, em número e eficiência acima dos requisitos, aumenta exponencialmente o consumo sem acrescentar qualidade real ao ambiente classificado.

Por outro lado, a utilização excessiva de filtros, mantendo filtros que ainda são eficazes, mas com um alto índice de enchimento, também aumenta o custo energético da instalação. Neste sentido, a ISO 14644-16 recomenda a aplicação de uma política de “ciclo de vida” aos filtros, substituindo-os com base em critérios de eficiência energética, ou seja, quando o aumento do custo devido ao consumo de energia excede o custo de amortização do novo filtro.

CARGAS TÉRMICAS

As cargas térmicas, de frio e calor, são outro dos grandes fatores de consumo de energia numa Sala Limpa. A ISO 14644-16 recomenda a abordagem da eficiência energética das cargas térmicas a partir de diferentes ângulos:

  1. Redução da carga térmica: Ao aumentar a eficácia do isolamento em relação ao exterior e ao racionalizar as cargas internas, estudando como minimizar ou isolar as cargas térmicas interiores.
  2. Racionalização dos pontos definidos: Seleção dos pontos definidos e gamas de variabilidade de acordo com as necessidades reais da sala. A norma ISO 14644-16 assinala a possibilidade de permitir que a humidade flutue entre 30 e 70% quando o requisito de controlo da humidade é apenas para conforto dos ocupantes. É também aconselhável especificar pontos definidos, de temperatura e humidade, mais flexíveis durante períodos de baixa ocupação ou repouso.
  3. Racionalização do ar exterior: A entrada de ar exterior é uma das principais fontes de carga térmica no sistema de HVAC de uma Sala Limpa. A taxa de ar exterior deve ser calculada e justificada em função das necessidades de sobrepressão, oxigenação e ventilação. É muito comum determinar o caudal de ar exterior como uma percentagem do caudal total de impulsão. Segundo a norma ISO 14644-16, esta prática não tem qualquer base racional de justificação, não traz qualidade à Sala Limpa e é uma fonte de ineficiência energética.

Infelizmente, na versão espanhola publicada por AENOR, “Fresh Air”, ou seja ar exterior ou ar de reposição, foi traduzido erroneamente como “ar limpo”, o que significa que alguns raciocínios como a Taxa de Renovação de Ar (ACE) ou as recomendações para reduzir o caudal de ar exterior são confusos e difíceis de entender na versão espanhola. Ao longo do texto dois conceitos diferentes são misturados sob a mesma definição, em algumas partes do texto “ar limpo” está associado ao conceito de ar filtrado com baixo nível de partículas, enquanto em outras partes o conceito de “ar limpo” está associado ao ar exterior de renovação.

CONCLUSÕES

A ISO 14644-16 é um documento realmente útil para racionalizar e reduzir o consumo de energia em Salas Brancas. Oferece uma metodologia bem estruturada e fundamentada que cobre todos os fatores que afetam o desempenho das Salas Brancas. A sua metodologia é aplicável tanto a instalações novas ou remodeladas como a instalações em funcionamento.

As indústrias relacionadas com Salas Limpas têm na ISO 14644-16 um documento fundamental para manter custos operacionais viáveis, qualificar-se para subsídios ou isenções ligadas a fatores de eficiência energética ou cumprir com políticas de responsabilidade social em sustentabilidade.

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Miguel Ruiz

GMP Consultor

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